30 de abr. de 2012

Paulo Scott escreve sobre a FestiPoa


Texto publicado na edição de 23 de abril do jornal Zero hora.

Levando em conta o olhar e a curiosidade de quem observa as inquietações culturais gaúchas a partir de Santa Catarina recuando, sem desviar o foco, pelo Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e assim, em curva, até o Acre, há bem pouco tempo a pergunta era: o que há de novo no cenário dos eventos literários do Rio Grande do Sul?

Isso porque segue forte o interesse dos leitores dos demais Estados por esse extremo brasileiro que, para além de Dyonélio, Erico, Moacyr, Caio Fernando, Mario e também dos autores consagrados ainda em atividade, vem oferecendo ao país o maior volume de novos autores relevantes (hoje eventual lista abarcando prosa e poe¬sia contemplaria, com segurança, mais de 50 nomes de repercussão nacional)?

A novidade, em resposta à pergunta, veio, em meio a outras estreias, com a Festa Literária de Porto Alegre, invenção da cabeça de leitor apaixonado e muito atento ao contemporâneo nacional do jornalista Fernando Ramos. Admitido esse contexto e seu desejado amadurecimento, surge outra indagação pertinente: o que há de novo na FestiPoa e neste rótulo de quinta edição?

Talvez pelos autores e artistas que recusam tantos convites, mas se dispõem a participar dessa festa literária ao entender sua proposta nada conveniada aos encastelamentos literários, aos coronelismos que só admitem a promoção dos asseclas, aos apadrinhamentos que acabam guindando a posições políticas estratégicas pessoas incapazes de dialogar com o novo e olhar para além do próprio umbigo, ou talvez pela alegria que só existe no verdadeiro desprendimento; não há como saber ao certo. O que se pode afirmar é que nesta edição foi possível perceber o aumento significativo de escritores e editoras de outras partes do Brasil interessados em interagir com esse encontro que, em sua informalidade, não dispensa o ótimo conteúdo dos debates e a verticalização das opiniões.

Aqui se chegou e não é justo negar que a FestiPoa tem muito a repercutir e a ensinar com essa sua atualidade, com essa sua dinâmica de leveza e destemor diante da descentralização inevitável das curadorias, das eleições, das consuetudinárias puramente mercantis e resistências canônicas. O grupo de pessoas que se constituiu em torno da iniciativa de Fernando Ramos conserva de maneira notável o entusiasmo e a irreverência da primeira edição.

Nesses dias de semana inicial estive próximo das observações pontuais e espirituosas de Beatriz Resende, César Aira, Italo Moriconi e Joca Reiners Terron, todos na condição de convidados pela primeira vez, e posso assegurar seu contentamento com o que viram. Superam-se os protocolos e se monta uma festa que parece não dar atenção ao tal onde exatamente quer chegar. Reclama-se tanto da ingenuidade enquanto valor das soluções criativas, e, no entanto, ressurge nessa proposta de celebração do conteúdo literário, como ressurge em tantos outros acontecimentos aparentemente corriqueiros pelo país, a chance de revisão e oxigenação dos diálogos. A festa vem ganhando tamanho e cobiças, só espero que não perca o seu despojamento nem sirva à criação e ao enraizamento de novos coronéis, de novos caciques.