17 de jul. de 2012

Cristian De Nápoli

Nasceu e vive em Buenos Aires. Publicou, entre outros, os livros de poemas Limite Bailable, El Ringue e Los Animales. É editor (Black & Vermelho) e um dos maiores divulgadores da poesia hispano-americana contemporânea, organizando, há alguns anos, na capital argentina, o festival latino-americano de poesia Salida al Mar, por onde passaram dezenas de poetas hispano-americanos e brasileiros, entre eles Chacal e Carlito Azevedo, Marília Garcia e Laura Erber. A relação e os intercâmbios de Cristian com a poesia brasileira são intensos, ele é o maior divulgador da poesia contemporânea do Brasil na Argentina. Traduziu e editou a antologia de poesia contemporânea Cuatro Poetas Recientes del Brasil (com poemas de Joca Reiners Terron, Angélica Freitas, Ricardo Domeneck e Elisa Andrade Buzzo) e a antologia de prosa Terriblemente Felices – Nueva Narrativa Brasileña, com autores como Sérgio Sant´Anna, Marcelino Freire, Jorge Mautner, Marçal Aquino, Milton Hatoum, Nelson de Oliveira e João Gilberto Noll, entre outros. Cristian esteve este ano na FestiPoa Literária, ministrando oficina sobre a obra de Roberto Bolaño e lendo seus poemas ao lado de Fabrício Corsaletti e Angélica Freitas, além de participar de debate sobre a produção literária latino-americana com os professores Rubén Daniel e Karina Lucena. 
No momento, Cristian traduz uma antologia de contos de Nelson Rodrigues, a sair este ano em Buenos Aires, e prepara seu novo livro de poemas Golpes de kriss e planeja tradução de poemas de Mario Quintana.






A seguir, dois poemas de Cristian.


Flores en el aeropuerto


En un escritorio trabajan
todas las comas del mundo – no las busques
en el aire al borde de la respiración.
Donde hubo paciencia no pidas pausas.

Esto es un ramo. Esto está dentro de un ramo.
Nunca en otra ciudad
entró a una florería el que al lado tuyo
renuncia a distinguir cualidades.

Si te llegó aquel bouquet
que te mandé en el día de tu cumpleaños
habrás leído la nota.
En francés tuvo sentido volver a disculparse.

No me importa que tus defectos también se agolpen.
Sé del catalán que sedujo a la encargada de un hostel
hablando mal de vos.
Yo hace mucho que te conozco.

Noches en que no ignoré la paja
puedo separarlas del trigo.
Sólo no pidas que la venganza me parezca
un medio de comunicación. El tiempo pasó.

Noches de escribir. Noches de paja.
Puedo separarlas de un hall de aeropuerto.
Ya decirle abnegación a esa paciencia
sería un engaño: sólo escolaricé a mi egoísmo.


Hice una balsa a golpes de mí mismo.
Visto entre aviones el esfuerzo se diluye.
Ahora me callo, no paro de hablar. O podés
mirarlo así: empecé a esperarte.


(tradução: Alexandra Lucas Coelho)

Flores no aeroporto

Num escritório trabalham
todas as vírgulas do mundo — não as busques
no ar à beira da respiração.
Onde houve paciência não peças pausas.

Isto é um ramo. Isto está dentro de um ramo.
Nunca em outra cidade
entrou numa florista aquele que a teu lado
renuncia a distinguir qualidades. 

Se te chegou aquele buquê
que mandei no dia do teu aniversário
terás lido o cartão.
Em francês fez sentido voltar a pedir desculpa.

Não me importa que os teus defeitos também se acumulem.
Sei do catalão que seduziu a responsável de um hostel
falando mal de ti.
Eu há muito que te conheço. 

Noites em que não ignorei o joio
posso separá-las do trigo.
Só não peças que a vingança me pareça
um meio de comunicação. O tempo passou. 

Noites de escrever. Noites de joio.
Posso separá-las de um hall de aeroporto.
Já chamar abnegação a essa paciência
seria um engano: só escolarizei o meu egoísmo.

Fiz uma jangada com golpes de mim mesmo.
Visto entre aviões o esforço dilui-se.
Agora calo-me, não paro de falar. Ou podes
vê-lo assim: comecei a esperar-te.



**

Albukassen


A eso
le sigue el acto de robar
para darle dos pitadas
el cigarrillo de la hermana
y, todo en uno, tomar
de la barra un vaso
de vidrio grueso con rombos
tallados en relieve
piramidal
desde la base hasta una altura
de cuatro centímetros siendo
el resto cinco centímetros
pulidos liso, bambolearlo
con los dedos en campana
sobre la boca del cristal,
sostenerlo con las dos manos,
volver a mirar,
llevar el vaso a los labios,
rolinga pilas por el líquido
acaramelado,
apurar de un sorbo
la mitad del contenido,
dejarlo en la boca con el ápice
de la lengua aplastado
contra el paladar,
inclinar la cabeza
apenas hacia su derecha,
sonreír con los labios
húmedos bien apretados,
alzar la mano libre, la izquierda,
mover con la palma hacia sí
el dedo índice en gancho, extender el brazo
en posición horizontal,
palpar
lo que venía mirando, una boca , un cuello,
con los labios siempre apretados
abrir esta otra boca y destilar.


Albukassen. Alquimista persa que vivió en el siglo X, la suya es la descripción más antigua que se conserva sobre el proceso de destilación del whisky.


(tradução: Ricardo Domeneck)

Albukassen

A este
segue o ato de roubar,
para dar-lhe duas tragadas,
o cigarro da irmã
e, ao mesmo tempo, tomar
do balcão um copo
de vidro grosso com pirâmides
talhadas em baixo
relevo
da base até uma altura
de quatro centímetros sendo
o restante cinco lisos centímetros
polidos, girá-lo
com os dedos em tenda
sobre a boca do cristal,
soerguê-lo com as duas mãos,
tornar a olhar,
levar o copo aos lábios,
baladeira pilhada pelo líquido
caramelado,
sorver de um gole
a metade do conteúdo,
deixá-lo na boca com o cimo
da língua pressionado
contra o palato,
endireitar a cabeça
em sua direção,
sorrir com os lábios
úmidos bem tesos,
erguer a mão livre, a esquerda,
mover com a palma a si
o dedo índice em gancho, estender o braço
em posição horizontal,
tocar
o que vinha olhando, uma boca, nuca,
com os lábios sempre tesos
abrir esta outra boca e destilar.


Albukassen. Alquimista persa que viveu no século X, autor da mais antiga descrição conhecida sobre o processo de destilação do uísque.