24 de abr. de 2013

Por dentro da FestiPoa: Fernando Ramos


Fernando Ramos recebeu ontem (23/04) o Troféu Amigo do Livro da Câmara Rio-grandense do Livro

Se você nos acompanha, já deve saber que este blog também se preocupa em mostrar como funciona a FestiPoa Literária. Não poderia faltar aqui, dessa forma, uma entrevista com Fernando Ramos,  idealizador e organizador do evento .

Construindo a Festa Literária de Porto Alegre há seis anos, Ramos divide a função de agitador cultural com o trabalho como servidor público. A energia para ir muito além do trabalho rotineiro e cuidar de um evento que cada vez mais se solidifica no calendário de atividades culturais da cidade vem de uma constante busca por criação e poesia. “A rua sempre me agradou mais, porque é onde as coisas acontecem pra valer”, ele responde quando é questionado sobre a opção de direcionar seu potencial criativo para promover encontros em detrimento de escrever livros ou estudar literatura (as duas últimas acabam sendo opções mais comuns para amantes dos livros). E ainda completa: “prestar um serviço é algo que me agrada. No fim, tudo é invenção e trabalho, e essas duas coisas se misturam. Se, com isso, a paisagem ao redor mudar um pouco, já valeu”.

Na entrevista abaixo, Fernando Ramos expõe como se deu a criação da FestiPoa Literária, explica como o evento se organiza e dá seu ponto de vista sobre a edição de 2013.

O que motivou e segue motivando a criação da FestiPoa Literária?

A motivação para fazer uma festa de literatura surgiu da necessidade de tentar dar mais visibilidade ao jornal Vaia.  O ponto de partida foi isso. O Vaia, a cada nova edição publicada, reunia diversos artistas (principalmente escritores) para divulgar novos trabalhos, de músicos a escritores, em encontros meio sarau, meio festa e balada. A partir disso, pensei em unir esse clima boêmio, de celebração das artes, com debates sobre livros, ideias e um tanto de reflexão a respeito do que se produz de literatura hoje em dia. Falei com Marcelino Freire, escritor e idealizador da Balada Literária (que acontece há 8 anos em Vila Madalena, SP) sobre essa ideia e ouvi um pouco das experiências dele com a Balada e pesquisei como eram outros eventos literários. Me pilhei, e em duas semanas desenhei a primeira edição da FestiPoa. Falei com o pessoal das livrarias Nova Roma e da Palavraria e com alguns apoiadores, e a ideia tomou corpo. Em 40 dias estava na rua a programação da primeira edição, que teve cerca de 40 escritores e artistas convidados e três dias de duração.

Acho que Porto Alegre tem uma inclinação para o diálogo e o debate. E também para o lance do encontro social em torno da literatura e do livro. Os saraus e eventos para se ler literatura em voz alta, que vem aumentando de uns tempos pra cá, confirmam isso. Há muita gente fazendo coisas legais na cidade, há muito interesse em torno da literatura. Às vezes, o que falta é mais divulgação do que é bacana se conhecer. Acho que, de modo geral, as coisas só se modificam para melhor, com ação política. E entendo que concretamente a ação política eficaz só se dá via poesia, imaginação. Só a poesia oxigena, e a imaginação dá energia para modificar o estabelecido e indicar novas perspectivas.

Então, qual a necessidade de se criar e se levar adiante mais um evento literário no RS ? Esse estado tão educado, culto, preocupado com a diversidade cultural, cuja população lê muito e está atenta a produção da literatura contemporânea. Cada vez mais duvido de afirmações desse tipo. Temos alguns mitos e falsas noções a respeito do que somos e fazemos culturalmente que precisam ser contestados. Um evento literário novo que surge ou um festival de artes são superimportantes e contribuem para discutir essas falsas noções, são necessários para aquecer o debate cultural. O objetivo da FestiPoa, além de tentar colaborar com a divulgação da literatura e contribuir para que mais pessoas tenham acesso à leitura, é questionar e contestar. Parece pretensioso, mas não é. A iniciativa de criar esse evento é individual, não está sob injunção de política editorial, institucional, ou atrelada à política de secretaria de cultura. A FestiPoa é feita meio à margem dos caminhos convencionais que se costumam percorrer nessa área. Porém, há um grande número de pessoas, amigos escritores e artistas, que colaboram, desde a primeira edição, para o seu desenvolvimento e crescimento. E esse número de colaboradores só cresce. O público também vem crescendo muito a cada edição. Isso pode ser um indicativo de que se o trabalho for constante, algum resultado positivo se alcançará.

Como o evento é organizado e pensada a programação?

Nem feira, nem festival, a FestiPoa não requer crachá ou credencial, é aberta a todos, procura ser plural em sua programação afim de oferecer o máximo possível de diversidade de linguagens. Sempre com a intenção de trazer novos autores, dar oportunidade para quem está surgindo, ou para artistas cujos trabalhos merecem mais visibilidade, ou que estão um pouco distantes de seus leitores. O caráter festivo do evento é importante destacar também. Buscamos imprimir certa atmosfera de irreverência, boemia e hedonismo no que se apresenta de atividades e programação.

Cite alguns encontros ou fatos que aconteceram durante o evento que representam para ti o que é a FestiPoa.

São muitos fatos legais e marcantes. Citarei alguns encontros: Ivan Izquierdo, Armindo Trevisan e Altair Martins discutindo memória e literatura, na mesma noite em que Caetano Galindo, tradutor da mais nova edição de Ulisses, e Aguinaldo Severino (organizador do Bloomsday há 19 anos em Santa Maria-RS) liam e comentavam o revolucionário romance de Joyce no bar Ocidente. Xico Sá entrevistando os cartunistas Adão Iturrusgarai e Laerte. Paulo Scott comandando uma noite de poesia e música no Porão do Beco com presenças de Flu, Laerte, Guazzelli, Fabio Zimbres, Daniel Galera, João Gilberto Noll, Cardoso, enfim uma turma muito massa. Sergio Faraco lendo um conto seu no palquinho da Palavraria e autografando dezenas de livros aos leitores. Luis Fernando Veríssimo, a pedido de Carpinejar, “escrevendo”, no calor da hora da mesa de abertura da FestiPoa 2009, uma crônica na qual dava a escalação de uma “seleção” do Internacional de todos os tempos.

Como foi pensada a programação da sexta edição?

Sempre é pensada de modo a oferecer a maior variedade de vozes, a diversidade artística é um ponto que valorizamos, assim como a presença de autores que estão surgindo com trabalhos consistentes esteticamente e verve crítica afiada. Uma grande preocupação, de agora e de sempre, é oferecer programas capazes de atrair o maior número possível de leitores e interessados em arte e, particularmente, em literatura. O acesso mais direto à arte literária e aos autores é o desafio do trabalho da produção do evento. Afortunadamente, a FestiPoa possui um capital afetivo grande, são muitos os amigos escritores e artistas que contribuem com idéias, sugestões e propostas para o evento. Esse será um grande trunfo, a construção coletiva de algo que poderá dar resultado positivo. Acredito nisso.

Bom, parte da programação desta edição se compõe de atividades que tratam da obra do homenageado Cristóvão Tezza, da celebração do centenário de Vinícius de Moraes e de um grande número de oficinas, cursos e worshops direcionados às pessoas que trabalham com a mediação de leitura e a educação (vamos desenvolver ao longo do ano um programa dedicado a mediadores de leitura, "Invenção de leitores", constituído de projetos e ações voltadas para o fomento à difusão da leitura de literatura). Educadores, professores e estudantes terão acesso a conteúdos diferenciados e poderão participar, futuramente, da elaboração da programação das próximas edições da FestiPoa. Buscamos trabalhar junto com educadores para que a literatura tenha um maior alcance. Queremos ser aliados nesse trabalho, que tem quem ser incansável e a longo prazo.

Alguns dos nomes de destaque, dentre os mais de cem convidados: Cristóvão Tezza, Antonio Cicero, Lirinha, Marcelo Yuka, Liniers, Daniel Galera, JR Duran, Carpinejar, Charles Kiefer, José Castello, Vicente Franz Cecim e Altair Martins. A figura do escritor-anfitrião é outra novidade: Altair Martins, escritor premiado e parceiro desde a primeira hora da FestiPoa, foi escolhido para desempenhar esse papel na festa literária. Lançamos um concurso literário, para autor estreante, na categoria conto, cuja premiação será a publicação do livro do vencedor. Gostaria de destacar, ainda, os patrocínios e apoios. A FestiPoa também angariou um novo patrocínio para a edição 2013: com  financiamento da Lei Rouanet (Ministério da Cultura), além da IESA veículos, o BNDES será patrocinador do evento. Além desses, a festa recebe apoios culturais da Secretaria de Cultura do Estado do RS, da Casa de Cultura Mario Quintana, da Caixa Econômica Federal, do Sintrajufe-RS e do Itaú Cultural. E outros tantos apoiadores e parceiros renovam suas colaborações ao evento.

Imagine que um leitor deste blog jamais tenha ido à FestiPoa, e que esteja pensando agora mesmo em participar, o que ele deveria levar para aproveitar ao máximo o evento?

Que olhasse a programação que se apresenta com curiosidade. Há muitas opções de programas para aproveitar. Que não deixe de ir com a alma inquieta e o espírito boêmio. A diversão é por nossa conta.

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